Isaías 5.8-10
“Ai de vocês que compram todas as casas
e se apossam das terras,
Expulsando os antigos moradores,
Fixando placas de “Não entre”,
Tomando conta do país e
deixando a população sem abrigo e sem terra.
Ouvi, por acaso, o Senhor dos Exércitos de Anjos dizer:
“Esses casarões vão ficar vazios.
Essas propriedades imensas ficarão desertas.
Uma vinha de dez alqueires produzirá apenas uma jarra de vinho,
um barril de semente produzirá dez quilos de trigo”.
Na estrada da transformação do Brasil uma medida se impõe: a reforma agrária.
O país tem sofrido de aguda injustiça fundiária desde o seu nascedouro: as chamadas capitanias hereditárias, onde portugueses recebiam incomensuráveis glebas de terra no país, foram as medidas escolhidas pela coroa portuguesa para incentivar a invasão e colonização do país.
Desde então a nação brasileira sofre a desdita de ver grande parte de seu ativo fundiário na mão de poucos proprietários, isso sem contar que muitos destes proprietários galgaram essa posição por meios violentos e ilegais.
Nada é tão confuso e tão eivado de corrupção no país quanto a questão da posse da terra.
Uma das questões que subjazem nesse desafio nacional é o princípio de que, no Brasil, se alguém tiver poder aquisitivo, pode ter o quanto de terra e casa quiser.
Como se pode perceber o princípio que norteia o texto bíblico é contrário a esse paradigma, isto é, o texto impõe limites, ninguém pode ter tudo o que quer só porque pode.
O princípio das escrituras impõe limites ao poder aquisitivo.
E esse é o primeiro padrão que precisa ser atacado no país, é preciso impor um limite à posse, tanto ao número de propriedades, quanto ao tamanho das mesmas.
Segundo as escrituras, ninguém pode concentrar propriedades a ponto de ameaçar a moradia ou direito à terra, que todos os seres humanos devem usufruir.
Isto é justamente o que acontece no Brasil, o direito à moradia é negado por causa do jeito como a propriedade privada é permitida, um jeito totalmente injusto.
Concentrando-nos na questão agrária nos damos conta de que o país sofre, ainda, a agravante de que o latifúndio pratica a monocultura, movido pelo que o mercado internacional melhor pague, que é o princípio do chamado agronegócio.
Esse princípio compromete a agricultura de subsistência, responsável pela produção de alimentos, e é responsável pelo êxodo rural, e pelo aprofundamento da pobreza, e pela opção pelos transgênicos, e pelo excesso de agrotóxicos; e, ainda, atenta contra a economia popular e contra a soberania nacional.
O agronegócio vende os grãos e depois nós os readquirimos beneficiados pelos nossos antigos clientes, agora, credores.
E tem a questão dos transgênicos, porque acabamos por pagar royalties por algo em que, até então, éramos soberanos, as sementes, por exemplo.
Há, ainda, que se considerar que os transgênicos transformam seres humanos em cobaias; e submetem o meio ambiente a impacto não prognosticável.
O que é preciso fazer no campo, é, também, preciso fazer na cidade.
O povo de Israel recebeu ordens de renovar a sociedade a cada 50 anos. Era a lei do jubileu.
As terras, a cada 50 anos tinham de ser devolvidas para os antigos beneficiados, isto é, para os respectivos moradores das tribos possuidoras destas,
Quando Deus distribuiu, entre as tribos de Israel, as terras das nações que ele havia julgado, por terem chegado ao limite da iniquidade tolerada na história, estas terras não seriam propriedades das tribos, mas usufruto em comodato.
As terras não podiam ser vendidas, apenas as colheitas, num total de 49 colheitas, no final das quais as terras teriam de ser devolvidas.
Os que entregaram as terras para pagamento de dívidas, poderiam ofertar o seu trabalho por metade do salário, para pagamento dessas dívidas, caso a entrega das colheitas não fosse suficiente.
Escravização, em Israel, era esse empregar-se por metade do salário para pagamento da dívida contraída, cujo pagamento não fora saldado com a venda do direito a 49 colheitas.
Esse tipo de relacionamento empregatício tinha um prazo de sete anos, após o que, o trabalhador tinha de ser liberado e suas dívidas perdoadas.
Acumulação de terras era proibida em Israel.
O profeta Isaías estendeu esse princípio, também, para a realidade urbana, pois, no texto, Deus passa a utilizar, na cidade, a mesma lógica aplicada para realidade rural.
O profeta Isaías acrescenta que Deus irá julgar os acumuladores de casas, fazendo com que suas mansões fiquem desertas, assim como julgaria os acumuladores de terra com improdutividade.
No Brasil a realidade da possibilidade de acumulação desmedida no mundo rural, transferiu-se para a realidade urbana: na cidade uma pessoa pode, em tese, ser dona de todas as moradias, transformando todos os possíveis moradores da cidade em seus inquilinos, ou os condenando a viver em situação de rua.
Em princípio a Bíblia não é simpática à ideia de posse.
E, sem dúvida, é totalmente contrária à acumulação e à concentração, de modo a que alguém possa ser a única moradora do lugar, ou seja, a única proprietária.
Em outras palavras, a Bíblia limita a posse de propriedades, porque questiona a lógica da propriedade privada, logo, esse pretenso direito não pode ser usufruído às custas do direito à moradia, a que todos os seres humanos fazem jus.
Portanto, na Escritura Sagrada, direito à moradia é superior ao direito à propriedade.
O objetivo de Deus é que todos tenham moradia.
Na fala de Jesus Cristo, isso está contemplado no seu comentário sobre a nudez, em Mateus 25.36 quando Jesus disse: “estava nu e me vestistes”, ou seja, não me deixastes exposto a minha fragilidade.
E o que cobre o ser humano, de fato, na vida em sociedade, é o usufruto do direito à moradia.
Assim, uma sociedade cristã, dá prioridade à função social da propriedade urbana, porque dá prioridade à moradia.
No mundo rural, a Bíblia dá prioridade à produção de alimentos, porque dá prioridade à segurança alimentar, que só é possível em pequenas propriedades, até porque a Bíblia não apoia o latifúndio, como disse o profeta.
Nós, cristãs e cristãos no Brasil temos de tomar posição ao lado das reformas agrária e urbana, a nossa fé ensina isso.