“Dá ouvidos, SENHOR, às minhas palavras e acode ao meu gemido.
Escuta, Rei meu e Deus meu, a minha voz que clama, pois a ti é que imploro.
De manhã, SENHOR, ouves a minha voz; de manhã te apresento a minha oração e fico esperando.
Pois tu não és Deus que se agrade com a iniquidade, e contigo não subsiste o mal.
Os arrogantes não permanecerão à tua vista; aborreces a todos os que praticam a iniquidade.
Tu destróis os que proferem mentira; o SENHOR abomina ao sanguinário e ao fraudulento; porém eu, pela riqueza da tua misericórdia, entrarei na tua casa e me prostrarei diante do teu santo templo, no teu temor.
SENHOR, guia-me na tua justiça, por causa dos meus adversários; endireita diante de mim o teu caminho; pois não têm eles sinceridade nos seus lábios; o seu íntimo é todo crimes; a sua garganta é sepulcro aberto, e com a língua lisonjeiam.
Declara-os culpados, ó Deus; caiam por seus próprios planos. Rejeita-os por causa de suas muitas transgressões, pois se rebelaram contra ti.
Mas regozijem-se todos os que confiam em ti; folguem de júbilo para sempre, porque tu os defendes; e em ti se gloriem os que amam o teu nome.
Pois tu, SENHOR, abençoas o justo e, como escudo, o cercas da tua benevolência.”
O salmista está em crise com a igreja. Uma coisa interessante, porque, ao ler os Salmos, a gente lê sobre os inimigos, os perseguidores etc... Mas, nem sempre se dá conta de que Davi está falando sobre a igreja, está falando sobre o povo de Deus. Ele não está falando das nações inimigas. Ele não está falando das nações pagãs.
Ele está falando dos adversários dentro do próprio povo de Deus. Gente que, como ele, deveria estar louvando ao Senhor, deveria estar buscando a face do Senhor, deveria estar adorando ao Senhor. Mas, ao invés, estão atacando Davi.
Foi o caso de Saul, o primeiro rei de Israel, escolhido pelo povo e ungido pelo sacerdote-profeta Samuel. O Senhor falava com ele. Ele chegou a profetizar. Teve experiências com Deus e depois se tornou um terror. E Davi foi um dos alvos desse terror que o Saul se tornou.
Então, com exceções, muitas das orações de Davi, senão a maioria, que são os Salmos, se referem a lutas que ele enfrentava na vida e dentro de Israel. Com gente de Deus, em tese. Gente do povo escolhido; circuncidada; que ia ao templo; que oferecia os holocaustos; que conhecia a Lei de Deus, a Torá... Gente de Deus.
Essa é uma batalha para a qual a gente não está preparado, e nem sabe se o deveria, que é o fato de que, no meio do povo de Deus, a gente pode se decepcionar.
É gente que está no templo, no caso dele, no tabernáculo; que vai com ele no mesmo lugar, leva o holocausto como ele, do mesmo jeito. Mas, o está perseguindo, atacando, julgando, prejudicando.
Ele, entretanto, faz uma separação dentro da própria comunidade da fé. Ele diz que há os que buscam abrigo no Senhor, os que se deixam defender pelo Senhor, os que amam ao Senhor, os que encontram felicidade só no Senhor, os que obedecem ao Senhor.
Davi está em luta com gente de casa. E é aquela angústia: como é que gente de dentro de casa faz isso? Pois é, este é o ponto.
Estamos, dentro da própria casa, num ambiente difícil; tem gente que se entende nossa, mas, que, na verdade, não se converteu; e há quem se converteu, mas caiu da graça. E tem o que está passando por um momento difícil na vida. E quem se deixou aprisionar por Satanás, porque teve alguma crise e não confiou em Deus, então aceitou ofertas malignas, e depois, por causa disso, o maligno passou a ter uma influência sobre a vida dessas pessoas, que elas não conseguem dimensionar.
E há os que se apoderaram de Deus, como se o pudessem, e se tornam a medida da verdade, e, em nome de Deus, matam aos irmãos, julgando estar fazendo a vontade de Deus. O Deus que não é mais o revelado nas Sagradas Escrituras, mas o Deus projetado pela maldade do falso adorador.
Nós estamos num ambiente espiritual. O ambiente espiritual é muito delicado. A gente não tem uma ideia dos processos que acontecem no mundo espiritual, à nossa volta!
Não temos ideia de como as pessoas estão sendo afetadas pela realidade espiritual; de como estão sendo tentadas e caindo ou não em tentação; de como estão a dar, ou não, ouvidos à voz do inimigo.
A gente não sabe, e não precisa saber! Nós não temos autoridade para julgar ninguém. Precisamos é saber que essas coisas vão acontecer.
Gente de casa vai se revoltar contra o Senhor e vai quebrar as Leis do Senhor.
Gente de casa vai romper com o Senhor, mas, vai continuar em casa. Vai continuar nas instituições, vai continuar no ambiente. Inclusive, gente que rompeu com o Senhor pode ser pastor, pode ser presbítero.
Nós não temos um ambiente só espiritual, temos, também, um ambiente formal.
Num ambiente formal você tem estatutos, liturgias, você tem maneiras de assumir poder, de assumir controle, etc... Sem que seja a vontade de Deus. E aí, de repente, você tem um cara mau como rei. Foi ordenado em função de Deus, mas rompeu com o Senhor. Como foi com Saul.
Gente há que vai para a reunião de culto, mas não cultua Deus. Tem só religião, mas não tem fé. Tem religião, mas não tem mais o temor de Deus, não tem mais respeito por Deus, e muito menos pelo ser humano.
Gente que, de alguma maneira, na luta por achar a sua própria história, o seu próprio caminho, rompeu com Deus. Isso não é uma coisa difícil de acontecer, porque a vida é como um teste constante. E nem sempre a gente passa no teste.
Gente que, ontem, estava adorando ao Senhor, hoje está cheio de dúvidas.
Se Deus cuida de mim por que está acontecendo isso comigo, ou com a minha casa, ou com a minha família, ou com a minha situação? Quando uma pessoa fica cheia dessas dúvidas, pode dar ouvidos a um bocado de vozes, que vão lhe dizer: ache o seu esquema, ache o seu jeito de resolver o seu problema, porque Deus não o resolveu. Ela, talvez, não confesse isso, explicitamente, mas fará o sugerido.
O que fazer diante disso? Davi pede a Deus que julgue, mas, também, pede aos fiéis que não desanimem, que não caiam na esparrela de usar das mesmas armas que os em crise, que continuem a louvar e a confiar no Senhor, a se manter em comunhão, para, continuamente, desfrutarem do aconchego do Senhor.
Em outras palavras, pede, aos fiéis, que não permitam que a infidelidade dos demais roube a sua alegria no Senhor, ou a vida comunitária, assim como a vida devocional, onde o fiel se deixa abrigar pelo Senhor.
Porque, no final das contas, os infiéis não estão, diretamente, pecando contra os fiéis, eles estão pecando contra Deus. Os fiéis estão, no dizer de Paulo, sofrendo o que resta dos sofrimentos do Cristo pela Igreja (Cl 1.24).
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